EDITORIAL
TERÇA-FEIRA, 19 DE AGOSTO
A Lei Magnitsky e o Brasil
O nível de tensão diplomática entre Brasil e Estados Unidos não foi advertido por ninguém. Esperava-se, sim, algum incômodo num primeiro encontro de Lula com Trump, visto haver o Presidente brasileiro manifestado sua simpatia, durante o processo eleitoral do ano passado nos EUA, pela candidata democrata. O que fazia sentido, eis que Joe Biden havia tido um papel importante na defesa do processo eleitoral no Brasil em 2022, enviando, inclusive altos chefes militares, o que contribuiu decisivamente para congelar as expectativas dos golpistas. Os americanos deixaram claro que não apoiariam aventuras da extrema direita bolsonarista, mesmo quando elas apontavam para um estreitamento ou alinhamento com ESTADOS UNIDOS. No primeiro momento, essa impressão, de relativo alívio entre Lula e Trump, quando o Brasil ficou ao lado dos atingidos por apenas 10% no Tarifaço do famoso “Dia da Libertação”, ganhava corpo e tudo indicava que as tensões iriam se dissipar com o tempo. De uma hora para outra, porém, Trump partiu para a ofensiva, numa sequência de atitudes infundadas, carregadas de informações equivocadas, como dizer que o Brasil era superavitário em sua balança de comércio com Estados Unidos, que culminaram na elevação de tarifas aduaneiras sobre produtos brasileiros na ordem de 50% e na aplicação da Lei Magnitsky sobre o Ministro Alexandre de Moraes.
“O que prevê a lei Magnitsky
As sanções propostas pela Lei Magnitsky são descritas como bastante pesadas, e alguns chegam a chamá-la de "pena de morte financeira";
Caso seja aplicada, a pessoa não pode ter cartão de crédito de nenhuma das grandes bandeiras que operam nos Estados Unidos;
Quem sofre a sanção não pode ter conta em banco nos Estados Unidos. Caso o banco permita, ele próprio não poderá operar nos EUA e pode ser alvo de sanções secundárias;
Instituições financeiras do mundo todo podem ser obrigadas a congelar ativos, fechar contas e cancelar cartões de crédito da pessoa sancionada;
Além disso, a pessoa pode ser impedida de ir para os Estados Unidos ou ter seu visto cancelado;
A aplicação da lei também acarreta uma questão reputacional, pois a pessoa entraria para uma lista de sancionados, que inclui violadores sistemáticos, contumazes e brutais de direitos humanos.”
Poucos dias depois, mercê dos esforços de negociação do Vice Alkmin, alguns produtos exportados foram excluídos dos 50%, mantendo-se está alíquota, entretanto, para café e carne, mas a pressão política exigindo a suspensão do Processo em curso do Supremo, contra Bolsonaro e sua trupe, recrudesceu. Ela vem sendo alimentada por novas ameaças reverberadas pelo Encarregado de Negócios da Embaixada Americana, elevando o tom das tensões entre nossos países. Tudo indica que referido funcionário está cavando sua expulsão do país, com vistas a agravar ainda mais a já delicada situação diplomática entre Brasil e Estados Unidos.
Do ponto de vista nacional, o Brasil, através do Presidente da República, tem se comportado com cautela, inclusive evitando aplicar o direito de retaliação sobre produtos americano, ao tempo que estimula negociadores a manterem contato com governo e empresários americanos. Procurou , no campo comercial, o recurso à Organização Mundial do Comércio, em defesa de seus interesses comerciais afetados pela ofensiva de Trump. No campo político, os Presidentes do Senado Federal e da Câmara, mais ameaçados por Eduardo Bolsonaro do que propriamente pelo Governo americano, tem se mantido igualmente cautelosos, colocando-se ao lado do Poder Executivo na defesa da soberania nacional. Já o Judiciário, aliás mais atingido politicamente por Trump, através de manifestações do Ministro Gilmar Mendes em apoio a Alexandre de Moraes e de decisões do Ministro Flávio Dino, que desqualifica a aplicação da Lei Magnitski no território nacional, tem se mostrado mais incisivo. Reitera que o processo contra os golpistas, Bolsonaro aí incluído como cabeça da conspirata, que chegou a apontar para o assassinato de Lula, Alkmin e Moraes, seguirá seu curso normal até o julgamento dos réus, a saber de 2 a 12 de setembro próximo.
Enquanto isso, o país se prepara para enfrentar positivamente o choque externo adverso do tarifaço. Já fez isso, aliás, deste tipo de choque em outros tempos, alavanca de mudanças estruturais com o modelo de substituição de importações. Ele não terá efeitos globais significativos sobre o PIB e emprego, mas afetará, sobretudo médias empresas com produção de semi acabados que têm no mercado americano seu exclusivo mercado. Lula evita procurar diretamente o Presidente Trump convicto de que tal iniciativa não conduzirá, senão, à uma inútil exposição, que poderá leva-lo á uma humilhação pública, tal como já ocorreu com o Presidente da Africa do Sul. Volta-se para a abertura de outros canais comerciais e políticos , estreitando os contatos com os países membros do BRICS na esperança de maior apoio dos seus membros ao Brasil. Ontem, Putin ligou para ele e relatou o resultado do encontro com Trump no Alaska, quando, certamente, avaliaram o curso de geopolítica contemporânea à luz das grandes potências. Dificilmente o Brasil teria ficado fora desta conversa, não por algum protagonismo que possa vir a ter, mas pelo seu simples tamanho – somos um dos cinco maiores países do mundo quando associamos PIB/ Território e População - e reflexos, sobretudo, sobre América Latina e África.
No fundo, há uma esperança de que no desenho da nova geografia de Poder sobre o mundo e em vista da acomodação dos interesses russos na sua área de influência, Trump também venha a tratar o Brasil com menos interesse ideológico, fomentado pela dupla Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo – o neto do último ditador que ficou seis anos no Poder, de 1979 a 1985 – e mais alcance estratégico. Afinal, cá no hemisfério, estamos muito longe, tanto da Rússia quanto da China, para associarmo-nos às suas respectivas sateizações.
É esperar para ver...

